Arquivo Pessoal |
Essa cena só mostra a humildade de mais uma atleta que ajudou a desbravar um caminho tortuoso para o país na modalidade. Ela é a quinta personagem da Série Pioneirismo, uma homenagem do Brasil Zero Grau ao Dia Internacional da Mulher e um reforço à campanha contra o fechamento da maior pista de patinação do país, no Rio de Janeiro (link do abaixo-assinado à direita).
Elena, aliás, é parceira antiga do Brasil Zero Grau antes mesmo do blog sequer existir. Foi personagem do meu TCC em 2010, quando escrevi um livro-reportagem sobre alguns brasileiros que competem em esportes de inverno. Depois, foi uma das primeiras entrevistadas deste espaço, lá em novembro de 2012. Nas duas situações lamentou não ter aprendido mais a língua portuguesa, mas fez questão de realçar seu amor pelo país.
"Eu tive uma experiência maravilhosa competindo pelo Brasil. Eu sinto que esta foi uma grande oportunidade para que eu pudesse ajudar o país a estabelecer um programa de patinação artística e ajudar na meta de ter um patinador brasileiro classificado para os Jogos Olímpicos", escreveu Elena em 2012.
Sonho que por muito tempo foi dela própria. Elena Rodrigues nasceu no dia 14 de janeiro de 1990 em Mineapolis, nos EUA. Ao contrário das outras patinadoras, é pelo pai que a jovem conseguiu a dupla cidadania. Ele nasceu e cresceu aqui, mas cursou a universidade no país norte-americano e ficou por lá, constituindo sua família.
A primeira filha, Irina, nasceu em 1982 e cinco anos depois começou a patinar no gelo. Elena nasceu, fez três anos e viu a irmã mais velha patinando num rink. Foi amor à primeira vista. Não largou mais. Dividiu seu tempo com o futebol até completar nove anos, quando passou a se dedicar somente à patinação. Treinava no Parade Ice Garden, em Mineapolis, e nem pensava na possibilidade de competir no cenário internacional pelo Brasil.
Arquivo Pessoal |
As conversas evoluíram. Enquanto Stephanie Gardner e Simone Pastusiak se aventuravam em competições adultas, Elena se preparava para disputar o Mundial Júnior de 2008. Foi a primeira competidora do país a disputar o torneio.
E não fez feio não! Ficou na 44ª posição num total de 56 competidoras, com 29.14 pontos na sua apresentação do programa curto - a maior nota conquistada por uma brasileira até então, mesmo não se classificando para o programa longo. "Fiquei feliz com meu desempenho no Mundial Júnior em 2008. Foi minha primeira competição pelo Brasil e eu acho que fiz um bom programa", escreveu ela em 2010.
A ideia, claro, era começar a competir em provas internacionais, visando os Jogos Olímpicos de 2014. Mas quem acompanhou as outras atletas retratadas nesta série já sabe: Elena já estava na faculdade e iria ter que escolher entre a carreira de atleta e estabilidade na vida profissional.
Claro que Elena entrou na universidade. Cursava Estudos Esportivos na Universidade de Miami e tentava conciliar com sua agenda de treino. Mas o tempo começava a rarear. Eram duas horas diárias, de segunda a sexta-feira. Muito para Elena, mas pouco se comparado com atletas de alto nível e do que Isadora precisaria fazer anos mais tarde para chegar aos Jogos Olímpicos.
O calendário da universidade também influenciava em suas competições. Disputava provas menores nos EUA, mas não conseguia disputar grandes eventos. Voltou a representar o Brasil apenas no Four Continents em 2010, quando ficou 35ª posição e foi a melhor das três brasileiras presentes (Alessia Baldo e Simone Pastusiak). Sua nota no programa curto foi de 24.74 pontos, menor do que ela havia conquistado dois anos antes.
Um ano depois, ainda como universitária, representou o país na Universíade de Inverno na Turquia, ficando na 28ª posição. Depois disso, já com a CBDG sem verba e com ela sem tempo para se dedicar aos torneios internacionais, resolveu encerrar ali sua carreira como atleta brasileira.
Arquivo Pessoal |
Parou de competir, mas não abandonou a patinação no gelo. Segue competindo apenas em torneios universitários nos EUA. Virou professora em 2012 e hoje dá aulas na Universidade Tecnológica de Michigan. "É algo mais recreacional, mas é uma forma divertida para que eu possa continuar competindo e patinando como um estilo de vida".
Também virou torcedora. Vibrou com a classificação olímpica de Isadora ("não esperava que fosse acontecer tão rápido assim!", escreveu) e acompanha de perto todas provas que envolvem os brasileiros, incluindo Kevin Alves e Luiz Manella. Também tem um sonho antigo: montar uma seleção brasileira de patinação sincronizada caso essa modalidade se tornasse olímpica.
Mas no fundo, lá no fundo, ainda sente uma saudade do período em que era atleta internacional do Brasil. "Eu sonho o tempo todo, mas meu corpo está ficando velho e treinar em período integral realmente não é mais uma opção para mim. Gostaria de competir em outra Universíade, mas só acontecem a cada dois anos. O ideal é a CBDG investir imediatamente na Isadora e no Luiz por eles terem melhores condições de se desenvolverem".
Desenvolvimento que só foi possível graças às lutas de Elena Rodrigues e outras guerreiras da patinação artística no gelo do Brasil.
Postar um comentário